
A nova política tarifária dos Estados Unidos gerou uma “bagunça” que o mercado vem digerindo aos poucos e foram um gatilho para investidores em todo mundo diminuírem a alocação em dólar. “Isso acaba sendo vento a favor para a maioria das moedas e países” – inclusive para o Brasil.
A opinião é de Pedro Jobim, sócio e economista-chefe da Legacy Capital, que possui R$ 15 bilhões sob gestão em fundos de investimentos. Ele é o convidado dessa semana do programa InfoMoney Entrevista, em uma série especial de conversas com painelistas da Expert XP 2025, um dos maiores eventos sobre investimentos do mundo.
A saída de investimentos denominados em dólar levaram a moeda a perder cerca de 10% do seu valor. Parte desses recursos veio para os mercados brasileiros que, segundo Jobim, ficaram “rasos” – com alocação baixa – nos últimos anos. “Quando é assim, qualquer fluxo acaba fazendo preço”.
Confira o que o economista espera para os movimentos futuros do dólar e da bolsa nos principais trechos da entrevista, reproduzidos abaixo:
“Tarifas foram gatilho para menor alocação em dólar”
A pressão sobre os preços de ativos vem muito a reboque do que tem acontecido lá fora – mais do que aqui dentro. E estamos num ambiente com uma cara um pouco mais positiva, ganhando um pouco de segurança.
A introdução das tarifas pelo governo dos Estados Unidos, em abril, gerou uma bagunça no mercado, mas de alguma forma isso está sendo destilado, digerido. O mercado se acomodou ou absorveu os 10% de tarifa para a maioria dos países, a inflação nos EUA vem sendo melhor que o esperado, o crescimento está desacelerando de uma maneira organizada.
“Uma das consequências das tarifas é que elas foram um gatilho para os investidores em todo mundo diminuírem as alocações em dólar. Nos últimos cinco anos, a proporção de ativos denominados em dólar – seja bolsa, renda fixa, etc. – sobre o total de ativos disponíveis ficou muito acima da proporção do PIB dos EUA sobre o PIB global.”
De abril para cá, a gente vê a depreciação do dólar, que perdeu em torno de 10% do valor. Isso acaba sendo vento a favor para a maioria das moedas e países, pois gera fluxo de recursos.
“Mercados no Brasil ficaram rasos, qualquer fluxo faz preço”
No Brasil, os mercados ficaram muito rasos. A participação de estrangeiros na dívida diminuiu muito – mesmo na dívida de longo prazo, que era um reduto de investidores de fora. A bolsa também ficou rasa, com vários fundos encerrando ou diminuindo de tamanho. Quando é assim, qualquer fluxo acaba fazendo preço.
A moeda aqui também é beneficiada pelo nível alto dos juros, pelo crescimento que o país vem experimentando.
Outro ponto é que observamos uma queda gradual da atividade econômica. Os bancos centrais da Europa, por exemplo, já chegaram no limite da queda dos juros. Outros, no Canadá e no Reino Unido, estão nas últimas rodadas de queda. Quem ainda falta reduzir juros é o Fed [Federal Reserve, banco central dos EUA], e está crescendo a probabilidade disso se materializar de maneira mais intensa nos próximos seis meses.
“Se a inflação não vier com toda força nesses próximos meses e se observarmos o mercado de trabalho desacelerando, seria um ambiente favorável para o Brasil e vários países emergentes”
“Movimento do dólar deve continuar por alguns meses”
Considerando uma janela mais longa, de 20 ou 30 anos, o dólar ainda está apreciado, a despeito dos 10% que perdeu. Em março ou abril, a moeda estava no ponto mais apreciado dos últimos quase 50 anos.
Se as coisas se encaminharem com os juros caindo aos poucos, a atividade desacelerando, mas sem grandes colapsos, e sem a volta de agressividade dos EUA no plano tarifário, o que poderia interromper [a depreciação do dólar] é algum evento maior de aversão ao risco. Poderiam ser os conflitos [no Oriente Médio], mas não vem sendo o caso.
Nossa expectativa é de que o movimento do dólar continue ainda por alguns meses.
“Uma posição importe dos nossos fundos é contra o dólar”
Uma posição importante dos nossos fundos é uma cesta de moedas comprada contra o dólar – ou uma cesta de dólar vendido, apostando na queda. Às vezes essa cesta está mais lastreada em moedas de países desenvolvidos, como o euro; às vezes, está mais cíclica, com moedas mais apimentadas, como o próprio real. Esse tema é bem presente na nossa carteira e vem sendo uma constante desde abril.
“Outro tema é a continuidade do bom momento das empresas de tecnologia nos EUA. Temos uma visão muito positiva sobre inteligência artificial e os ganhos de produtividade que ela pode gerar”
O terceiro tema é bem de Brasil. Desde abril, estamos incluindo posições aplicadas em juros, mirando o fim do aperto monetário pelo Banco Central e a perspectiva de atividade econômica mais fraca para frente. Está sendo difícil cravar o fim do ciclo, porque o mercado de trabalho ainda está forte, a concessão de crédito continua pujante. Mas há algumas indicações de alta frequência que sugerem uma desaceleração à frente.
Retorno dos multimercados: “Vendido em dólar, comprado em tech, aplicado em juros”
Vou até bater aqui [na madeira], mas estamos caminhando para um semestre – se Deus quiser – acima do CDI, depois de um período difícil. Os temas de investimento que foram os motores foram a venda de dólar, a carteira de bolsa comprada em tecnologia e vendida em índices amplos, e as posições aplicadas em juros.
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